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quarta-feira, 28 de maio de 2014

O dia em que levei um desaforo para casa.




Não lembro ao certo como aconteceu, mas não esqueço do fato que serviu de motivação para escrever este texto. Um emaranhado de palavras grosseiras foram atiradas contra mim no estacionamento de um shopping. Não me recordo exatamente o que foi dito. Também pudera, eram adjetivos quase incompreensíveis aos meus ouvidos pela velocidade que saíram da boca do cidadão. Eu não havia feito nada de tão grave para receber aquelas pancadas verbais tão ferozes. Talvez um pequeno deslize, mas nada que justificasse aquele show de retaliação. Anteriormente, ao me ver em situações semelhantes, com ou sem razão, eu tratava logo de revidar, no mesmo nível. “Levar desaforo pra casa? Eu? Nem pensar”.

Mas o dia estava ensolarado. 

Era sábado.  

Eu estava bem acompanhado.

Quer saber? Vou fazer diferente. “Pode embrulhar este desaforo para viagem. Eu vou levar!”. Então eu fiz um sinal de positivo, subocando, simultaneamente, um pedido de desculpa. Foi assim que terminei o enredo antes do previsto. Foi desse jeito que evitei o nascimento de mais um desaforo no mundo. Foi nesse dia que decidi abandonar o famoso “toma lá, dá cá”.

O agressor (agressão verbal ainda é agressão), ao perceber a minha reação, entre o sorriso sem graça de quem estava aceitando a minha retratação e a vergonha no olhar ao analisar o baixo nível de seu discurso, disse: “tudo bem. Essa movimentação aqui é estressante”. E deu uma risadinha murcha, caminhando na direção contrária como uma criança consciente de ter quebrado o vaso mais valioso de sua mãe.

Quando estamos felizes com o que e quem nos cerca, quando estamos bem resolvidos com as nossas escolhas e ações, deixamos de superestimar  as conclusões precipitadas que fazem sobre nós. Vão pensar que sou um idiota por não ter respondido à altura? Tanto faz. A estatura minúscula do discurso que ouvi não me apetece.

Rebater uma ofensa é dar à luz a um novo desaforo. O mundo já está lotado de grosserias e não há espaço para mais. Prefiro carregar o maldito desaforo comigo do que entregar para alguém que arremessa o peso de seus problemas e a sua agressividade impulsiva contra os outros sem nenhum sentimento de culpa, e que talvez não tenha espaço ou paciência para mais nenhum desaforo consigo. E é aí que mora o perigo.

Eu não me importo mais em levá-los para casa. Melhor assim do que deixá-los em mãos erradas. De herança ao mundo, começo a fazer a minha parte. Mais gentileza, menos grosseria.

Não há razão em dar o troco numa moeda que não tem valor algum.

Há lições que vêm depois de muitos erros. Quase nunca em tempo hábil para serem usadas por nós mesmos. Dessa vez deu. Eu levei um desaforo para casa e não doeu.

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